PASSA UM NAVIO AO LARGO DOS MEUS OLHOS*
o presente é um esboço de desenho, de poema
uma música trauteada com a ajuda de longos dedos
descarnados, uma fotografia desapurada com o pior
enquadramento da cidade, talvez
um reflexo da córnea inflamada.
o presente que abraço é a realidade que há muito
findou para os outros.
retenho maquinalmente ou infiltro por osmose
a gota de chuva, caindo aos pés da criança de cabelos
desgrenhados e ponta do nariz suja de lama,
o jornal gratuito deixado ao abandono e chicoteado por um
deus qualquer,
o navio que parte levando consigo os homens da Lisboa para
o horizonte:
é já ali em frente!, aponta o marinheiro à jovem amada.
alimento-me de memórias armazenadas ao acaso,
perdidas em sinapses de uma cabeça doente
cujo crânio é quebrado
por uma chuva de olhares, invadido pela febre
crónica de um coração frouxo
e anacronismos crassos,
continuamente assaltado pela questão da veracidade da
sua existência.
Se vivo, viver é apenas sonhar?
não creio, ou seria provável humanidade significar um
ajuntamento de animais estáticos e extasiados nas suas
próprias quimeras.
(será possível esta realidade?)
deambulo pela minha Lisboa e anseio, sem saber por que razão,
tropeçar na vida - quem sabe, numa madrugada ébria.
por enquanto,
encubro a própria morte bebendo em estranhos e aprendendo
o ofício de sentir.
Susana Quartin Alves da Silva
* Verso de Miguel Torga, escolhido como tema do Concurso Literário de 2007, ano de comemoração do centenário do nascimento do poeta
na próxima sexta
Há 12 horas
Olá. Sou a mãe babada da Susana. O nome dela é Susana Quartin Alves da Silva. A Susana, por pudor, penso eu, nunca disse nada. Se puderem alterar agradecia.
ResponderEliminarObrigada.
Paula Quartin (prof de Matemática da escola no ano lectivo 81/82)
Correcção realizada. Os pedidos sinceros de desculpa à Susana e à mãe babada, e muito justamente babada!
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