sexta-feira, 30 de julho de 2010

SUGESTÕES PARA FÉRIAS

ESTRELA ERRANTE , Jean-Marie Gustave Le Clézio

É a descrição de uma longa viagem em busca da Terra Prometida; é também a viagem de Hélèna/Esther/Estrela, a menina que ao longo do romance se fez mulher, à procura de si mesma , da sua Identidade, até ao mais fundo de si - é a história de cumplicidades forjadas entre as personagens, fruto de encontros e desencontros, mais ou menos prolongados e que, ainda que fugazes, como o do encontro com Nejma, deixam a marca do desconforto moral , da extrema violência do mundo dos excluídos.
“Esther descobre o que pode significar ser judia em tempo de guerra: após uma adolescência serena, vai conhecer o medo, a humilhação, a fuga pelas montanhas e a morte do pai. Terminada a guerra, Esther parte para o jovem estado de Israel. Mas a Terra Prometida não lhe vai proporcionar a paz: à chegada terá um encontro com Nejma, que deixa o seu país com as colunas de palestinianos rumo aos campos de refugiados. Esther e Nejma, a judia e a palestiniana, nunca mais deixarão de pensar uma na outra”. (nota do editor na badana da capa)
Neste romance acontece um duplo deslumbramento com a melodia e o poder das Palavras:
O da protagonista, ao ouvir os textos sagrados …
” Encostada à parede fria da capela, Esther ouvia de novo as palavras incompreensíveis naquela língua doce e sincopada, sem tirar os olhos do velho iluminado pelas velas. Uma vez mais sentiu um arrepio , como se aquela voz desconhecida soasse apenas para ela, no seu íntimo. A voz baixa, ciciante, lia o livro e aquilo apagava nela a fadiga , o medo e a raiva…(pág.102)...gostava muito de ouvir as histórias que o rabi Joël contava. Abria o seu livro negro e lia lentamente, primeiro naquela língua tão bela, simultaneamente áspera e doce, que eu ouvira no templo, em Saint-Martin. A seguir falava em francês, também lentamente….era como se fosse uma voz interior, que dizia aquilo que estávamos a ouvir. Falava da lei e da religião como se fossem as coisas mais simples do mundo. Explicava simplesmente o que era a alma falando da nossa sombra e o que era a justiça falando da luz do Sol e da beleza das crianças….” (pág. 165)
O deslumbramento do leitor/a com a escrita de Le Clézio, que eleva as palavras a um estado superior ao discurso do dia-a- dia, dando-lhes de novo o poder de invocação da realidade essencial.
“ Lembrava-se de querer partir com as nuvens. Porque elas deslizavam livremente ao vento e passavam sem dificuldade de um lado para o outro da montanha, indo até ao mar. Imaginava tudo o que elas viam, os vales, as ribeiras, as cidades semelhantes a formigueiros e as grandes baías onde o mar brilha. …. “ (pág.87)
Sem que eu consiga explicar muito bem porquê, Estrela Errante transporta-me para um universo de escrita feminina, o de As Ondas de Virginia Woolf, sem dúvida uma outra matriz de pertença, mas ainda assim o mesmo encantamento, com a música das palavras usadas para descrever uma relação quase fusional com a Natureza:
“ Lembrava-se de querer partir com as nuvens. Porque elas deslizavam livremente ao vento e passavam sem dificuldade de um lado para o outro da montanha, indo até ao mar. Imaginava tudo o que elas viam, os vales, as ribeiras, as cidades semelhantes a formigueiros e as grandes baías onde o mar brilha. …. “ (pág.87).


Também por isto, e como último apontamento e mais uma sugestão de leitura para férias, deixo um romance de Virginia Woolf – AS ONDAS. Marguerite Yourcenar, sua tradutora para Francês, descreveu assim este romance :
"As Ondas é considerado o melhor e mais radical romance de Virgínia Woolf – um desses raros escritores que nasceu no instante em que uma estrela se pôs a pensar".

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