sábado, 27 de março de 2010

DESCOBRINDO MEXIA


Cronista, poeta, dramaturgo, crítico de cinema, Pedro Mexia esteve na escola, a convite do Clube de Cinema, para apresentar um dos seus filmes de eleição.

Descubro-o agora, vagarosamente, como poeta.
Por exemplo, neste poema do seu livro Eliot e Outras Observações:

ALUNOS DO LICEU

Alunos do liceu que me passais pela retina
porque não vos fixais? Encostados ao vento
descem a rua, bando feliz, alguns isolados
em pequenas tristezas. Os rapazes, na sua rudeza

artificial, trazem raquetes, usam neologismos,
enquanto as raparigas, que ontem mesmo
despontaram, segredam cenários entre sorrisos.

Todos rua abaixo, mesmo a tempo
da aula das oito, e trazendo nas mochilas
insuspeitados tesouros.

segunda-feira, 22 de março de 2010

PRÉMIO DE POESIA PARA A NOSSA ESCOLA

NO DIA MUNDIAL DA POESIA, NO CCB


Mais uma vez, a nossa Escola recebeu um importante Prémio de Poesia.

Desta vez foi o 2.º Prémio do Secundário, no Concurso Nacional "Faça Lá um Poema", promovido pelo Plano Nacional de Leitura e o Centro Cultural de Belém.

Sejamos mais rigorosos. Quem recebeu o prémio foi o João de Almeida d'Eça, do 11.ºF, e o poema - extraordinário poema - é "Morte em Veneza".

Estivemos no CCB, na cerimónia de entrega dos prémios, integrada nas comemorações do DIA MUNDIAL DA POESIA, e ficámos a saber, pelo Fernando Pinto do Amaral, presidente do PNL e do Júri, que estiveram em concurso mais de 2500 poemas. A única coisa que ocorre dizer é que foi muito emocionante ouvir o João ler, maravilhosamente, o seu poema. A perplexidade face a esta tão madura reflexão sobre a fugacidade da beleza e da juventude, submetidas ao peso implacável do tempo, esse escultor, não deixa de nos acompanhar. Thomas Mann e Visconti estiveram por momentos sentados, ao nosso lado, no grande auditório do CCB.
Parabéns, João, por os teres convidado!

Já que não ficou registo gravado desse instante tão intenso, transcreve-se o poema.


MORTE EM VENEZA

Todos morremos em Veneza
todos somos Aschenbach
vendo a juventude fugir
esvaindo-se por entre os dedos.
Todos encontramos o pequeno Anselmo
e todos o perdemos entre a bruma da maré
e quando ele reaparece, tarde de mais,
jazemos mortos na areia cálida
o bafo moribundo contra a corrente
os olhos brancos fitando o céu.
E o pequeno Anselmo foge
em toda a sua resplandecência
vendo a nossa carcaça velha
apodrecer ao sol poente.
Sim! Todos somos Aschenbach
e vimos morrer a Veneza
roídos pela frustração,
pela dúvida e pela incerteza
e todos vemos o pequeno Anselmo
fugir com a sua beleza!

ESCREVER POESIA COM QUADROS DENTRO


Já se vai tornando um hábito - um bom hábito - ir ao Centro de Arte Manuel de Brito, em Algés, ver uma exposição e, de caminho, fazer uma Oficina de Escrita Criativa. Desta vez, a magnífica exposição de gravura de Bartolomeu Cid dos Santos convidava mesmo à evocação de Pessoa e não foi preciso reler muitos poemas para encontrar o verso certo para cada quadro, pegar nele, e usá-lo como mote para o poema a inventar.

Mas em primeiro lugar, falemos do pintor. Grande artista, gravador como poucos, quem o conhece? Quantos se lembram de ter visto um quadro seu? Em Tavira há umas escadinhas com o seu nome, no lugar onde teve o último atelier, depois do regresso de Londres e até à sua morte recente, em 2008. Devia ser proibido não conhecer a obra deste enorme artista português que viveu grande parte da sua vida em Londres e que na Literatura procurou insistentemente os temas da sua obra e que teve em Pessoa, sobretudo Álvaro de Campos, um motivo recorrente.

Partimos, pois, à procura das imagens de Bartolomeu Cid dos Santos e nelas procurámos as pegadas de Pessoa, e nessas pegadas o impulso para o nosso próprio salto de palavras - a palavra poética arrancada às imagens que aos poemas foram beber. Trajectória em Labirinto - curiosamente uma imagem multipresente nesta exposição - para encontrarmos os nossos labirintos interiores.

A turma que ali esteve, de corpo inteiro, foi o 12.ºB com a professora Assunção Sobral Gomes. Gostei mesmo desta turma. E do modo como se perderam nos quadros de Bartolomeu Cid dos Santos. E dos poemas que escreveram, eles que diziam que não eram grandes poetas...

Esta viagem do aLeR+ valeu mesmo a pena.

domingo, 21 de março de 2010

OUVIR EM VEZ DE LER

Ler é um acto que, na sua aparente e enganadora simplicidade, resulta de um longo processo histórico e da complexa formação cognitiva de cada um: lia-se, na Idade Média, pronunciando as palavras em voz baixa; não era conhecida a leitura silenciosa, sem mover dos lábios. Esta, que nos parece intuitiva, terá sido uma "descoberta" (provavelmente de mulheres: freiras que, para grande espanto dos que pela primeira vez as viram nessa prática, inventavam o acto, que hoje nos parece normal, de entrega à página de um livro, sem mediação da voz, como se a pessoa estivesse numa espécie de absoluto recolhimento).

Lê-se relativamente pouco em Portugal. Muitas das pessoas que sabem ler não gostam de o fazer. A leitura como um prazer é, obviamente, uma conquista. Mas que difícil, num mundo em que abundam e se buscam os prazeres que não dão trabalho, que se recebem passivamente.

Daí que me espante que certa editora apresente agora, como o último grito, "resumos de grandes obras" para se ouvir em i-pod. Ouvia há tempos, espantado, os argumentos de um orgulhoso responsável por este produto: que não podíamos recusar o «desafio das modernas tecnologias»; que se tratava de simplificar a vida dos jovens, apresentando-lhes, por exemplo, Felizmente Há Luar, de uma forma mais «motivadora» (porque, deduzo, os libertava da tarefa de "ler" a obra, permitindo-lhes que "ouvissem" um resumo dela). Era transbordando de vaidade que o senhor rematava: «Na altura dos exames, quando virem passar jovens de i-pod, quem sabe?, talvez estejam a ouvir Felizmente Há Luar».

Isto parece-me uma evolução ameaçadora. Não sou dos que pensam que a leitura esteja em risco - mas considero de uma irresponsabilidade que uma editora não perceba até que ponto está a corromper e a tentar substituir o que devia promover.

Provavelmente estou errado.

terça-feira, 16 de março de 2010

UMA RODA VIVA

Sempre numa roda viva, a nossa Biblioteca.


OFICINAS DE ESCRITA CRIATIVA
Em oficinas de escrita criativa, várias turmas do Básico e do Secundário têm sido convidadas a soltar a imaginação e a inventar prodígios. Recorde-se que o tema do Concurso Literário deste ano é precisamente O Dia dos Prodígios, título do romance com que Lídia Jorge, há trinta anos, iniciou a sua carreira literária. Recorde-se também que, dos textos criados nas oficinas irão ser seleccionados, nas turmas respectivas, os que poderão ser apresentados a disputar prémios.
Já foi a vez do 11º B, 11º G, 11º E, 7º B, 7º D, 7º A, 10º F, com as respectivas professoras de Português - Fátima Magriço, Mavilde Nunes, Ana Borba, Paula Varela, Irene Fonseca - e outras turmas se seguirão.
Com maior ou menor concentração, maior ou menor disponibilidade para a escrita, em comum há os casos extremos dos que declaram não ter ideias, ou não ter jeito para escrever, ou as duas coisas, e sempre, sempre, quem acabe com o contentamento, muitas vezes misturado de espanto, pelo resultado final, ao ter conseguido dar forma de palavra às ideias e imagens que, afinal, estavam (des)arrumadas em todas as cabeças.

LEITURA EM VOZ ALTA
Houve também lugar para a leitura em voz alta, com o décimo ano de História da Cultura e das Artes, acompanhado pela professora Fátima Madaleno, a mergulhar na atmosfera medieval do conto “A Dama Pé de Cabra”, de Alexandre Herculano – cujo bicentenário do nascimento se comemora em 2010 – e a descobrir que fantástico, almas penadas e outros mistérios têm a sua origem em épocas bem distantes, muito apreciados por exemplo pelo gosto romântico, antes de terem sido redescobertos pelos actuais fabricantes de bestsellers.
A redescobrir, também, o prazer de ler em companhia, dando à palavra impressa a sonoridade que ela contém, a saborear texto e voz(es).

CONFERÊNCIA
No mesmo dia, mas ao fim da manhã, mudámos de registo e preparámo-nos para assistir à Conferência de intrigante título que a Doutora Elizabeth Sousa iria proferir: SK – FP – RS: Pseudónimos e Heterónimos. Com agrado e curiosidade, uma assistência composta por duas turmas já iniciadas na poesia de Fernando Pessoa (O 12º A e o 12º C), acompanhadas das respectivas professoras de Português, Conceição Pereira e Mavilde Nunes, e outros professores interessados pelo tema, acompanhou a conferencista no traçar de relações entre a pluralidade de identidades a que tanto o filósofo Soren Kierkgaard como o compositor Robert Schumann deram existência e a heteronímia pessoana. Comunicadora cativante, usando a linguagem simples de quem domina com segurança as matérias que expõe, Elizabeth Sousa abriu perspectivas novas, sobre a obra do enorme e sempre inesgotável poeta.
De novo a Biblioteca contou com a Conceição Pereira, na dinamização de mais um encontro.

RODA DE LIVROS
E a Roda de Livros do 10º B voltou a girar, sob o impulso da professora de Português, Elisa Costa Pinto.
Desta vez, as raparigas dominaram, e com elas a escolha de alguns livros em que sentimentos e emoções são objecto de observação. Só Resta o Amor, de Agustin Paz, E Dizer-te uma Estupidez qualquer, por exemplo, Amo-te, de Martín Córdoba. O primeiro, contou a Erica, que confessou não ter hábitos de leitura, foi começado no dia do PARAR PARA LER, e depois lido de enfiada. Às vezes é assim, “primeiro estranha-se, depois entranha-se…”. O segundo prova como um título pode ser decisivo no momento da escolha de um livro. Deu origem a alguma discussão, sobre o estado de idiotice em que se pode ficar quando se está apaixonado, de tal forma que até os rapazes participaram, eles que não gostam nada de falar destas coisas…
Seguiram-se A Criança Que Não Queria Falar, de Torey Hayden, Adrian Mole e as Armas de Destruição Maciça, de Sue Townsend e Um Leão Chamado Christie, de Anthony Bourke, todos suscitando diferentes curiosidades, numa conversa que voltou a fluir, ágil e saborosa.

quinta-feira, 11 de março de 2010

UMA RODA VIVA

Continua a andar numa roda viva, a nossa Biblioteca

terça-feira, 9 de março de 2010

UMA EVOLUÇÃO PARALELA

Se alguns amores há que são para ser mascados rapidamente e engolidos, como fast-food, outros, mais difíceis mas mais compensadores, devem saborear-se. Assim sucede com a minha última paixão. Vou apresentar um pedacinho, um fragmento, só, desse amor vagaroso e exigente:

«Muito da força da tecnologia, pensada em sua generalidade, vem desta conversão de uma ambivalência ancestral numa função única. É isto que faz o avião voar, a roda do carro girar, a lâmpada acender - o assassinato do possível. A tecnologia não é a falsa maravilha mas a mais violenta delas, já que cala todas as demais. Pois quem pode garantir que o borrifamento gracioso e a dispersão contínua da água, como numa gigantesca fonte barroca, não seriam capazes, numa outra evolução tecnológica (feita a partir do pó e não do fogo, da lama e não da roda, do vinho e não do pergaminho, do grito e não da fala), de gerar mais energia do que as hedrelétricas? Ou que ao invés de utilizar aviões pudéssemos ser catapultados em colchões de ar até o outro lado do oceano, abraçados a travesseiros de penas de ganso que voassem ainda? Não haverá em nosso grito uma enorme fonte de energia desperdiçada, e será que o mecanismo de nossas pálpebras não dispensaria combustíveis fósseis? E se cuspíssemos para cima? E se não fizéssemos nada? E se acendêssemos lâmpadas com bocejos?»

Mantenho, como perceberam, o português do Brasil. O autor chama-se Nuno Ramos. O livro tem um título tão simples e tão inesquecível como isto: Ó! Foi Prémio PT em 2009.