sábado, 12 de dezembro de 2009

quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

CLARICE LISPECTOR SOBRE A LÍNGUA PORTUGUESA

(Clarice Lispector 10 de Dezembro 1920 - 9 de Dezembro de 1977)

«Esta é uma confissão de amor: amo a língua portuguesa. Ela não é fácil. Não é maleável. E, como não foi profundamente trabalhada pelo pensamento, a sua tendência é a de não ter subtilezas e de reagir às vezes com um verdadeiro pontapé contra os que temerariamente ousam transformá-la numa linguagem de sentimento e de alerteza. E de amor. A língua portuguesa é um verdadeiro desafio para quem escreve. Sobretudo para quem escreve tirando das coisas e das pessoas a primeira capa de superficialismo.
Às vezes ela reage diante de um pensamento mais complicado. Às vezes se assusta com o imprevisível de uma frase. Eu gosto de manejá-la – como gostava de estar montada num cavalo e guiá-lo pelas rédeas, às vezes lentamente, às vezes a galope.
Eu queria que a língua portuguesa chegasse ao máximo nas minhas mãos. E este desejo todos os que escrevem têm. Um Camões e outros iguais não bastaram para nos dar para sempre uma herança da língua já feita. Todos nós que escrevemos estamos fazendo do túmulo do pensamento alguma coisa que lhe dê vida.
Essas dificuldades, nós as temos. Mas não falei do encantamento de lidar com uma língua que não foi aprofundada. O que recebi de herança não me chega.
Se eu fosse muda, e também não pudesse escrever, e me perguntassem a que língua eu queria pertencer, eu diria: inglês, que é preciso e belo. Mas como não nasci muda e pude escrever, tornou-se absolutamente claro para mim que eu queria mesmo era escrever em português. Eu até queria não ter aprendido outras línguas: só para que a minha abordagem do português fosse virgem e límpida».

Clarice Lispector, A Descoberta do Mundo

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

RECEITA

E entre um pouco de tudo o que é importante e este blogue vai acolhendo, numa deliciosa desordem, aproveito para vos trazer aqui uma citação, também ela deliciosa.

Eis o diagnóstico de Pablo Neruda, leitor de Cortazar, que recomenda - peremptoriamente - a sua leitura:

«Quem não ler Cortazar está condenado. Não o ler é uma doença grave e invisível que, com o tempo, pode ter terríveis consequências. Algo de semelhante ao homem que nunca provou pêssegos e que vai ficando mais triste, visivelmente mais pálido e, provavelmente, aos poucos, perdendo todo o seu cabelo.»

PABLO NERUDA

ALER+ COM NADINE MESQUITA E O 7ºE













Decididamente, se há coisa que a turma 7º E tem mostrado é um enorme entusiasmo em todas as actividades em que se envolve. Desde a primeira visita à Biblioteca, na aula de projecto, passando pelas histórias tão bem contadas e tão bem ouvidas, até à sessão de 2ª feira, com uma convidada especial.
Antiga aluna da nossa escola, a ilustradora Nadine Mesquita falou sobre a arte da ilustração, sobre o diálogo perfeito que imagens e textos têm que estabelecer, sobre as emoções que as cores transmitem, e sobre muitas outras coisas. Todas acompanhadas com imagens, suas e de outros artistas, por exemplo as pranchas originais que criou para o livro O Dono de Tudo e a mascote “Choco Esperto”, também da sua autoria.
Uma assistência muito interessada e interessante, como se provou pelas intervenções, que nem queria acabar a conversa tão cedo .

De novo, parabéns ao 7ºE e aos professores Paula Varela, Cristina Nunes e José Garcia!
(E ainda só vamos em Novembro...)

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Histórias com Vários Sabores

“Eu achei esta aula muito divertida, porque foi engraçado ouvir histórias de diferentes países com diferentes culturas. E também as histórias que eram do nosso país foram divertidas de ouvir e ver”.
Ana Sofia

“Foi interessante, porque ouvi contos tradicionais que não conhecia, mas havia outros que conhecia. E aprendemos outras formas de contar uma história”.
Francisco Pontes

“Eu adorei as histórias, eles representaram muito bem os papéis e foi espectacular e engraçado. A representação do João e do Daniel foram um espectáculo e eu adorei. Muito, muito”.
Rafael

“Achei que foi interessante, pois estivemos a interagir com alunos de outras turmas e estivemos a contar histórias tradicionais de diferentes países. Os teatros foram engraçados e as histórias das alunas também.”
Andreia Monteiro

“Achei esta aula/sessão muito engraçada e acho que devia repetir-se. Também gostei muito de ser contadora de histórias e agora sei que um contador, enquanto conta a história, fica muito nervoso, principalmente se for para quem não se conhece. Acho que deviam repetir esta aula, mas com histórias diferentes”.
Rita Marques

“Gostei muito das apresentações e dos desenvolvimentos das apresentações dos meus colegas. Foi uma actividade bastante pedagógica e divertida: todos nós aprendemos novas histórias e morais. Gostei muito desta experiência.”
Carla Gonçalves

“Eu gostei muito, porque pareciam artistas, com talento. Havia peças que eu nunca tinha ouvido e eram interessantes.”
Mariana Duarte


“ Eu achei que foi uma actividade engraçada, os contos foram bem representados. Acho que se devia repetir, pois deu-nos a conhecer novos contos, não só do nosso país, mas também de outros”
Rodrigo Vilela

“… foi uma hora em que todos ficámos com um bocadinho mais de cultura.”
Joana Leite

“Eu gostei muito, principalmente dos contos da China, e também dos dois contos populares portugueses. Gostava que as aulas de Formação Cívica fossem todas assim.”
Verónica Amaral

“Gostei imenso, acho que até à data de hoje foi a melhor aula que já tive… As apresentações foram excelentes. Acho que a melhor foi a da “Tia Verde Água”, mas, como eu gostei de todas, não vou avaliar só uma, vou avaliar todas – excelente aula, excelente ideia”.
Tiago Ferreira

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

75 ANOS DA PUBLICAÇÃO DA MENSAGEM

No dia 1 de Dezembro de de 1934, precisamente há 75 anos, foi publicada a 1.ª edição de Mensagem de Fernando Pessoa. Esta obra, que viria a ser uma das mais importantes da história literária portuguesa, havia concorrido ao Prémio Antero de Quental, no qual foi ultrapassada por um livro medíocre, chamado Romaria, e escrito por um tal de Padre Vasques que, obviamente, não ficou para a História.

Não quero ceder à tentação, aqui, do elogio repetido e fácil. Mas posso ceder ao impulso de transcrever um poema da Mensagem.

Por que terei escolhido este? E quem resistirá a lê-lo, hoje?


Nevoeiro

Nem rei nem lei, nem paz nem guerra,
Define com perfil e ser
Este fulgor baço da terra
Que é Portugal a entristecer -
Brilho sem luz e sem arder,
Como o que o fogo-fátuo encerra.

Ninguém sabe que coisa quer.
Ninguém conhece que alma tem,
Nem o que é mal, nem o que é bem.
(Que ânsia distante perto chora?)
Tudo é incerto e derradeiro.
Tudo é disperso, nada é inteiro.
Ó Portugal, hoje és nevoeiro...

É a Hora!

Fernando Pessoa, Mensagem

terça-feira, 24 de novembro de 2009

E ASSIM FOI 3 NUNOS

Com a imperfeição que é própria dos grandes momentos e de tudo quanto vale a pena, realizou-se, na Biblioteca, a sessão que anunciáramos: os 3 Nunos.

Agora, está esquecida a série de trapalhadas com que nos debatemos para a pôr de pé: falta de tempo, ensaios insuficientes, negociações árduas com professores, para que nos cedessem a sua hora de aula - e cuja boa vontade agradecemos -, nervosismos de vários tipos. Ecoa ainda o que, isso sim, conta, o que fica, o que é lembrável: uma «sala cheia», o sacrifício de alunos que avançaram em luta contra o seu cansaço ou contra a sua timidez, a informalidade, a limpidez daqueles poemas, o humor das interpretações que foram feitas de certas pinturas, ou o empenho dos violas que nos ofereceram os acordes da música do Prata.

As afinidades soltaram-se no ar. E foram lindas de ouvir e ver, de ouvir-ver. (Não se esqueçam que se trata do Projecto Ouvisões).

Um agradecimento aos rapazes que tão bem disseram os poemas de Nuno Morais: João d'Eça, João Álvaro, Paulo Dias, Ruben Silva, Miguel Baptista.
Ao Bernardo e à Verónica, que, com tanto sentido de humor e sentido do trágico e do sinistro, nos foram propondo as surpreendentes pinturas de Nuno Viegas.
Ao André Silva e ao Luís Delgado, que aplicadamente apreenderam a dificílima melodia e no-la deram a respirar.

















Este é simplesmente um primeiro lote de fotografias que foram tiradas. Nem todos os intervenientes aparecem retratados, mas outras fotos há, que podem ser vistas aqui.

domingo, 22 de novembro de 2009

3 NUNOS

Nuno Morais foi um poeta português, que morreu ainda jovem.
A sua poesia, reunida num volume com o tragicamente premonitório título de Últimos Poemas, constitui um livro muito belo de todos os pontos de vista, em que a delicadeza dos sentimentos ou o humor contido na percepção da realidade nos colocam em face de ângulos imprevisíveis, modos incomuns de pensar, sentir e exprimir.

O segundo Nuno de que vos quero falar é Nuno Viegas, o pintor. E embora haja quem detecte nele influências evidentes (como, por exemplo, a de Paula Rego), a sua visão é, também, sempre um factor de perplexidade. As pinturas que apresenta trazem uma história imaginável - mas, dessa história, que não conheceremos na totalidade, o que Viegas capta é o momento mais inesperado, o mais tenso, o mais desequilibrado; o mais estranho, o mais sinistro ou o mais divertido.




E, porque estamos em maré de Nunos, o último é Nuno Prata, igualmente um jovem, mas, neste caso, compositor e cantor. Aquilo a que já ouvi chamar um cantautor! Que nos interessa neste Nuno final? Adivinharam. O dom de nos surpreender com uma música em que o amor é cantado sem que se caia no lugar comum, na fórmula gasta. E, na minha opinião, a própria melodia evolui como os nossos ouvidos não previam nem supunham.

Para quem queira vir surpreender-se, 3 Nunos é o nome da sessão em que, a 24 de Novembro (amanhã), pelas 10. 20, a Biblioteca se tornará palco de um fascinante exercício de afinidades, cruzamentos, encontros e, quem sabe?, desencontros...

Pela voz de vários alunos, a poesia de Nuno Morais, a pintura de Nuno Viegas, a música de Nuno Prata.

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

HISTÓRIAS COM VÁRIOS SABORES










Num encontro promovido pelo projecto aLer+ e pela professora de Língua Portuguesa, Paula Varela, o 7º E recebeu ontem algumas visitas, cada uma com sua história, vinda de distantes paragens. A Carla Gonçalves, do 7ºA, trouxe uma fábula da Guiné, ensinada pelo avô, “O Sapo e a Lebre”, a Maria de los Angeles Yao Y Chen e a Laura Chen Zhang, do 10º F, duas histórias da China, “Os Macacos e a Lua” e “O Desenho da Serpente”. Por sua vez, e para retribuir o presente, os anfitriões representaram com grande entusiasmo e algum humor histórias tradicionais portuguesas – “Os Dez Anõezinhos da Tia Verde Água”, “O Velho, o Rapaz e o Burro”, “Frei João sem Cuidados” – e o conhecido “Capuchinho Vermelho”. Os empenhados contadores foram o João Tiago Gonçalves, o Daniel Santos, a Mafalda Neves, a Rita Marques, a Joana Leite, a Andreia Monteiro e a Beatriz Neves.

Todos escutados com grande atenção e muito aplaudidos pela assistência, que deu algumas opiniões. Oportunamente as divulgaremos. Para já, ficam as imagens e os parabéns.

terça-feira, 17 de novembro de 2009

2007: 1º PRÉMIO DE POESIA

PASSA UM NAVIO AO LARGO DOS MEUS OLHOS*

o presente é um esboço de desenho, de poema
uma música trauteada com a ajuda de longos dedos
descarnados, uma fotografia desapurada com o pior
enquadramento da cidade, talvez
um reflexo da córnea inflamada.

o presente que abraço é a realidade que há muito
findou para os outros.
retenho maquinalmente ou infiltro por osmose
a gota de chuva, caindo aos pés da criança de cabelos
desgrenhados e ponta do nariz suja de lama,
o jornal gratuito deixado ao abandono e chicoteado por um
deus qualquer,
o navio que parte levando consigo os homens da Lisboa para
o horizonte:
é já ali em frente!, aponta o marinheiro à jovem amada.

alimento-me de memórias armazenadas ao acaso,
perdidas em sinapses de uma cabeça doente
cujo crânio é quebrado
por uma chuva de olhares, invadido pela febre
crónica de um coração frouxo
e anacronismos crassos,
continuamente assaltado pela questão da veracidade da
sua existência.

Se vivo, viver é apenas sonhar?
não creio, ou seria provável humanidade significar um
ajuntamento de animais estáticos e extasiados nas suas
próprias quimeras.
(será possível esta realidade?)

deambulo pela minha Lisboa e anseio, sem saber por que razão,
tropeçar na vida - quem sabe, numa madrugada ébria.
por enquanto,
encubro a própria morte bebendo em estranhos e aprendendo
o ofício de sentir.

Susana Quartin Alves da Silva


*
Verso de Miguel Torga, escolhido como tema do Concurso Literário de 2007, ano de comemoração do centenário do nascimento do poeta

domingo, 15 de novembro de 2009

CONTINUANDO À VOLTA DOS LIVROS

E ainda vagamente a pretexto de livros, não resisto a transcrever esta passagem que, entre outras qualidades, me parece tão sugestiva e tão bem escrita:

«Vejo-o, por exemplo, atrás do balcão no seu fato preto impecável, o cabelo bem penteado, a cara pálida de contornos definidos. Quando entra um cliente, coloca com cuidado o seu cigarro aceso no rebordo do cinzeiro e, esfregando as mãos magras, satisfaz zelosamente as necessidades do comprador. Por vezes - em particular se for uma senhora - faz um sorriso débil para exprimir condescendência para com os livros em geral, ou talvez escarnecendo de si próprio no papel de vulgar vendedor, e dá conselhos valiosos - isto vale a pena ler, ao passo que aquilo é um tanto pesado; aqui descreve-se de um modo assaz divertido a eterna guerra dos sexos e este romance não é profundo, mas é muito fresco, muito inebriante, sabe, como champagne. E a dama que tinha comprado o livro, a dama de lábios vermelhos e casaco de peles preto, leva consigo a imagem fascinante: aquelas mãos delicadas pegando nos livros com alguma falta de jeito, aquela voz contida, aquele sorriso fugaz, aqueles modos admiráveis. Em casa dos Khrustchov, porém, Smurov [que é, obviamente, a personagem que tem estado a ser descrita] começava já a causar uma impressão algo diferente numa certa pessoa.»

Este excerto, que é uma lição completa, foi escrito por Vladimir Nabokov. Encontra-se num livro chamado O Olho. Traduzido - e muito bem - por Telma Costa e editado pela Teorema.

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

ATENÇÃO, SUSANA QUARTIN!

Susana:

1. Gostaríamos que nos autorizasse a publicar, neste blogue, o maravilhoso texto - e não falo de cor, estou com ele nas mãos - com o qual ganhou o 1º prémio de poesia, num concurso promovido pela Biblioteca desta escola, em 2007.

2. Mas quando pedia que entrasse em contacto connosco, falava a sério: estamos interessados em envolvê-la em alguns projectos voltados para a comemoração dos 30 anos da ESLAV, que passará a chamar-se oficialmente E. S. José Augusto Lucas. Poderá contactar com o Centro de Recursos, através do endereço que encontra no site.

3. Obrigado.

COLÓQUIO Travessias Poéticas

Um colóquio a não perder.

terça-feira, 10 de novembro de 2009

"PARAR PARA LER" SEGUNDO ALGUNS ALUNOS DO SÉTIMO B

«Os verdadeiros leitores têm gosto de ler desde que nascem; os inteligentes aprendem-no.»
Afonso Gonçalves, nº 1

«Como eu não tenho quase tempo nenhum para ler, foi bom adiantar o meu livro.»
Gonçalo Silva, nº 8

«Acho que foi bastante enriquecedor, e até acho que se devia fazer isto todas as semanas. Quem teve esta ideia deve ser premiado, pois foi uma excelente ideia.»
Guilherme Tavares, nº 9

«Achei o Parar Para Ler muito interessante e engraçado porque, se repararmos bem, toda a escola estava a ler...!!!»
Joana Devesa, nº 12

«Eu achei o projecto Parar Para Ler muito interessante, porque a escola estava toda em silêncio. Nós, a turma +, estávamos na aula de Matemática, e no Pavilhão A não se ouvia barulho nenhum. A escola estava, até, mais silenciosa do que uma biblioteca.»
Leonor Costa, nº 16

«Eu não gostei muito, porque não gosto de ler, mas no fundo foi engraçado.»
Ricardo Pascoal, nº 24

«Eu achei o Parar Para Ler uma actividade engraçada e que me motivou para ler. Esta actividade é simples e ao mesmo tempo sofisticada.»
Sofia Leong, nº 26

«Foi um momento mágico... divertido... de sossego... e calma!»
Tomás

domingo, 8 de novembro de 2009

QUADROS COM BIBLIOTECAS DENTRO

O texto do Zé António pisca-me o olho, quer dizer, provoca-me a divertida estranheza dos jogos de espelhos. Explico-me melhor. Quando o li, achei que poderia ter sido eu a escrevê-lo. Gostava de o ter escrito.

Sempre gostei de livros com livros dentro. Como ele. E nas nossas afinidades electivas, podemos escrever Jorge Luís Borges, Musil, Umberto Eco e mais recentemente Carlos Ruiz Zafón, tudo gente que habitou - habita - a Biblioteca por dentro dos livros, dos seus livros.
Também, como todos eles, pressinto que a Biblioteca é um labirinto que reflecte e multiplica, (quase) até ao infinito, os nossos labirintos interiores.
Das portas que se abrem nas suas paredes, só quem nunca leu um livro não sabe. Imaginemos que cada livro, em cada prateleira, em cada estante, em cada fila, é, não uma, mas muitas portas! É que é mesmo! Portas para mundos que sem os livros jamais alcançaríamos – alguns são-nos completamente alheios, outros já eram nossos, escondidos nos corredores obscuros do nosso ser. É por isso que ler um livro nos afasta e ao mesmo tempo nos aproxima de nós mesmos. Nos dá a ler os outros, na exacta medida em que nos devolve a leitura do nosso eu mais interior.

Enfim, falávamos de LIVROS COM BIBLIOTECAS DENTRO e eu lembrei-me – como não me lembrar?... – de QUADROS COM BIBLIOTECAS DENTRO.
Quando, em viagem, visito museus, páro sempre mais tempo diante dos quadros com livros. Há muitos, dos livros religiosos nos frescos medievais e no Barroco meridional, aos livros nas mãos de burgueses ilustrados do Classicismo protestante ou aos livros languidamente caídos no regaço das meninas do século XIX. Depois há os livros do Arcimboldo, de Van Gogh, de Picasso, de Mondrian e sobretudo os melancólicos livros de Hopper, companheiros da insuportável solidão contemporânea.

Mas entre todos os pintores que sentiram o apelo sensitivo, visual, plástico dos livros, Maria Helena Vieira da Silva é, sem sombra de dúvida, aquela que mais e melhor pintou a BIBLIOTECA. Logo ela, portuguesa, nascida num país que pouco lê e que, quando ela nasceu em 1908, tinha cerca de 80% de pessoas analfabetas...

Olhemos, por momentos, a “Biblioteca em Fogo”. É um quadro do ano mágico de 1974, e podemos vê-lo ao vivo no belíssimo Museu Vieira da Silva, no Jardim das Amoreiras – do melhor que Lisboa tem para nos dar. Olhemos bem para dentro do quadro e escutemos o crepitar do fogo que se desprende do fundo, bem fundo, dos livros. É o mistério das portas que se abrem, infinitamente, dentro dos livros. E dentro de nós.

Era disso que falavas quando falavas da Biblioteca da nossa Escola, Zé António? Também eu acredito que ela guarda muitos mistérios. Saibamos nós incendiar os olhos.

"A Biblioteca em Fogo", pintura de M.ª Helena Vieira da Silva

sábado, 7 de novembro de 2009

LIVROS COM BIBLIOTECAS DENTRO

Uma biblioteca é um lugar onde se encontram portas secretas para outros mundos: abrindo-se um livro, atravessa-se uma fronteira.

Há inúmeros livros acerca de bibliotecas.
Evocando alguns, um pouco arbitrariamente, ao correr da minha memória, começo por falar de O Nome da Rosa. Existe, nessa história sobre uma série de crimes, quem seja assassinado por causa de um segredo. Tal segredo diz respeito a um livro. Por sua vez, o livro em causa encontra-se na biblioteca de um mosteiro medieval, já de si uma concentração de saberes diligentemente copiados por monges, onde a tradição e a inovação entram, por vezes, em choque.

Se quisermos dar um salto do passado para o futuro, podemos referir Fahrenheit 451. Trata-se de um romance maravilhoso, sobre o qual conversámos aqui mesmo, na Biblioteca da escola, no decurso de uma tertúlia. Numa sociedade de onde toda a escrita e toda a leitura foram banidas, porque o Poder as considera potencialmente perigosas, a biblioteca que os homens inventam é uma biblioteca humana, isto é, em que os livros são as próprias pessoas - aqueles resistentes que memorizam textos inteiros, ou capítulos essenciais, de modo a que a literatura se não perca nessa sociedade onde os derradeiros livros detectados são postos a arder...

Entre estes dois pontos extremos, encontramos outras bibliotecas: por exemplo, em O Homem sem Qualidades é-nos descrita uma biblioteca e, mais do que isso, um bibliotecário extraordinário, cuja função o obriga a uma visão de conjunto dos livros - o que, por outro lado, o impede de ler qualquer um deles em particular...(Curioso e terrível paradoxo, não é?)

Temos a Biblioteca de Babel, de Borges. Ou a biblioteca, no colégio de Harry Potter, onde se encontram os livros proibidos, que só sob o manto da invisibilidade podem ser procurados pelos jovens curiosos. E, muito mais recentemente, A Sombra do Vento, de Zafón, que guarda todo o mistério das novelas do século XIX, e onde um livro estranhíssimo (e com uma longa História) é escolhido por Daniel, uma personagem romântica, entre os labirintos de uma
biblioteca profunda, com qualquer coisa de diabólico...

Acredito que a biblioteca da nossa escola é, também, um lugar mais obscuro e secreto do que poderá parecer à primeira vista. Sob um ruído persistente, sob a dispersão de alunos que se interessam mais pela internet do que por livros, sob um soalho deprimente (que talvez venha a ser mudado em breve), algumas surpresas do outro mundo nos aguardam. Serenamente. Tranquilamente. (Aparentemente...)

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

As Vozes do Rio Pamano

As Vozes do Rio Pamano» é um romance de fôlego acerca das complexas histórias individuais que se ocultam por detrás da história da Guerra Civil de Espanha, cujas reminiscências perduraram ao longo de toda a transição do país para a democracia e que ainda hoje se fazem sentir, marcando a memória colectiva espanhola.Certo dia, no ano de 2001, uma professora e fotógrafa desloca-se à povoação de Torena para recolher material didáctico da velha escola que está prestes a ser demolida. Esta trivial circunstância irá desencadear a revelação de um enredo complexo, pois Tina toma posse de um caderno manuscrito que ali permanecera escondido ao longo de décadas e que contém as memórias do mestre-escola, numa carta que nunca chegou ao seu destinatário. Pouco a pouco, interpelada pelas experiências e pelos factos contados por Oriol Fontelles, Tina deixa-se envolver na memória histórica da aldeia, situada no epicentro da repressão franquista. E assim o leitor fica a saber como as coisas se passaram em Torena: assassínios e vinganças; jogos de poder e influência; medo e intimidação; combatentes da resistência, fascistas e heróis anónimos, cujas vidas permaneceram envoltas na bruma dos tempos e do esquecimento, obliteradas pela reescrita da propria história

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Silêncio Ensurdecedor

Todos nós já ouvimos falar daqueles momentos solenes em que o mundo se junta num só pensamento e faz um minuto de silêncio.

Desta vez não foi 1 nem 2, mas 45 minutos, que uniram alunos, professores e funcionários.

O silêncio podia ser imperial , mas dentro da cabeça de cada um corria um mar de pensamentos,mar turbulento de ondas ruidosas que desaguavam no mundo do imaginário e do fantástico.

Desde miúdos a graúdos, todos deram a mão ao seu livro e partiram numa viagem que só um livro nos pode levar a fazer : a viagem ao sonho e ao irreal.

E no meio daquele silêncio vagueiam os guardiões de todos os livros, aqueles que contêm a chave do sagrado refúgio. E na sua gôndola navegando no rio de pensamentos, iam registando aquele tributo aos seus companheiros.

Pois não é sempre que homem e livro se unem num só.
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quarta-feira, 28 de outubro de 2009

A ESCOLA A MEXER

É sempre com muito orgulho que vejo a escola mexer - a escola a mexer e parar para ler.
Não foram os professores, não foram os alunos, não foram os auxiliares administrativos, não foram os técnicos auxiliares. Foram todos, foi a escola.
Tive o papel privilegiado de percorrer grande parte da escola e das salas de aula. O desafio era fotografar o máximo de espaços na escola silenciosa, naquela meia hora que me pareceu durar dez minutos. Nas salas, de porta aberta, os alunos liam com os seus professores. Nos gabinetes, na sala de professores, na secretaria, no conselho executivo, no ginásio, na cozinha.
Aqui e ali, um dissidente. Alguém que dizia já não haver mais livros na biblioteca; um que se esquecera; outro que tinha muito trabalho e urgente. Casos pontuais, causas sem adeptos.
A leitura vingou, assim como a fotografia que, contestada por alguns, faz prova do que todos testemunhámos.

Obrigada colegas! Façam-nos mexer mais com paragens destas, que nós gostamos.

terça-feira, 27 de outubro de 2009

PARAR PARA LER - II

Magnífica, a experiência de hoje!

Espelho fiel da escola que somos: unida, cúmplice, entusiasta, quando vale mesmo a pena. As imagens são eloquentes e verdadeiras: foi toda a gente, em todos os cantos, a ler em companhia, como nos tínhamos atrevido a antecipar...

O lugar turbulento, de início, foi a Biblioteca, onde os mais distraídos acorreram a buscar um livro de última hora. Depois, o silêncio instalou-se e saboreámo-lo, intensamente.

Que bom! Parabéns a nós! Obrigada.

Paula Fonseca
coordenadora da Biblioteca e do projecto aLer+

PARAR PARA LER - I